As polêmicas do
novo Código Penal
Autor(es): Ricardo Brito
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O Estado de S. Paulo - 20/06/2012
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Do
terrorismo à descriminalização de alguns casos de aborto, confira as
alterações propostas pela comissão de juristas do Senado:
Após
sete meses de trabalho, a comissão de juristas do Senado que discute a reforma do
Código Penal chegou a um consenso jurídico sobre as propostas na
segunda-feira, 18, dia da reunião final. E foram tantas as sugestões de
mudança que o presidente do colegiado, Gilson Dipp, disse que nenhum tabu
ficou de fora. Mas será a partir de agora, com a busca do consenso político,
que a quebra de tabus se tornará o verdadeiro adversário do anteprojeto.
Integrantes
da comissão entregarão na quarta-feira da semana que vem o texto de 300
páginas ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). A proposta então
poderá ser formalmente discutida pelos parlamentares. Segundo eles, entre as
sugestões propostas, a maior batalha será senadores e depois deputados
aprovarem mudanças na legislação dos temas considerados religiosos, como o
aumento de hipóteses em que o aborto deixa de ser crime.
Pela
proposta, uma gestante de até 12 semanas poderá interromper a gravidez desde
que um médico ou um psicólogo ateste que a mulher não tem condições de arcar
com a maternidade. Atualmente, a prática é crime, exceto nas hipóteses em que
a gravidez acarreta risco para a vida da mãe ou é resultado de estupro.
Mas até
quem não é da bancada religiosa tem suas restrições à inovação. "Sou
totalmente contra interromper uma gravidez por essas razões. Se ela não tem
condições sociais para ter um filho, ela tem é de se cuidar", afirmou o
senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR), que é médico obstetra.
A
comissão também se envolveu em outras polêmicas. Propôs criar o crime de
enriquecimento ilícito nos casos de servidores ou autoridades públicas que
não conseguirem comprovar a origem de determinado bem ou valor. Também sugeriu
que a cópia de um CD de música ou de um livro didático para uso pessoal, sem
qualquer objetivo de
lucro, deixe de ser considerado crime de violação de direito autoral.
O líder
do PSDB no Senado, Alvaro Dias (PR), afirmou que a tradição da Casa é votar
em bloco as propostas de reforma de códigos. Dessa forma, o texto não é
fatiado por assuntos, mas acaba tendo tramitação mais demorada por falta de
acordo sobre temas diversos. Como exemplo, a comissão de reforma do Código de
Processo Civil aprovou em junho de 2010 seu texto
final e a proposta está ainda em tramitação na Câmara dos Deputados.
Eleições.
O tucano admite que neste ano a discussão da proposta de reforma do Código
Penal será ainda mais complicada por causa das eleições municipais, quando o
Congresso entra em recesso branco e temas sensíveis são deixados de lado para
não contaminarem a disputa. "Há temas que são perigosos em ano
eleitoral. Creio que neste ano vai ser difícil", afirmou.
Os 23
principais tópicos:
1. Aborto
No caso
do aborto, são sugeridas a diminuição das penas e o aumento nas hipóteses de
descriminalização. A principal inovação é que a gestante de até 12 semanas
poderá interromper a gravidez desde que um médico ou psicólogo ateste que a
mulher não tem condições de arcar com a maternidade
2. Ortotanásia
Deixa
de ser um homicídio comum, com pena máxima de 20 anos para até 4 anos de
prisão. A prática não será considerada crime quando o agente deixa de fazer
uso de meios artificiais para manter a vida do paciente, a doença é grave e
for irreversível, atestada por dois médicos, com consentimento do paciente ou
da família.
3. Enriquecimento ilícito
Servidores
públicos e agentes políticos dos três Poderes que não conseguirem comprovar a
origem de um determinado bem ou valor poderão ser presos por até cinco anos.
O Estado poderá se apossar do bem de origem duvidosa. Atualmente, ter
patrimônio a descoberto não é crime por si só.
4. Jogo do bicho
A
prática deixaria de ser contravenção, delito de menor potencial ofensivo,
para se tornar crime, com pena de até 2 anos de prisão. Ao contrário do que
ocorre hoje, os apostadores não estariam sujeitos a penas.
5. Furto
Uma
pessoa que devolva um bem furtado pode ter a pena contra si extinta. A vítima
tem de concordar expressamente com a restituição do produto, antes ou no
curso do processo. A anistia valeria também para os reincidentes na prática.
6. Progressão de regime
Dificulta
a progressão de regime para quem tenha sido condenado ao praticar crimes de
forma violenta, sob grave ameaça, ou que tenham acarretado grave lesão
social.
7. Abuso de autoridade
O
servidor público poderá ser punido com até 5 anos de prisão. Pela lei atual,
de 1965, a pena máxima é de 6 meses de prisão. Foi mantida a previsão para a
pena de demissão para quem tenha praticado a conduta.
8. Crimes hediondos
Embora
tenha excluído a corrupção do rol de crimes hediondos, o colegiado
acrescentou outros sete delitos ao atual rol: redução análoga à escravidão,
tortura, terrorismo, financiamento ao tráfico de drogas, tráfico de pessoas,
crimes contra a humanidade e racismo. Os crimes hediondos são considerados
inafiançáveis e não suscetíveis de serem perdoados pela Justiça, tendo
regimes de cumprimento de pena mais rigorosos que os demais crimes.
9. Crime de terrorismo
Foi
sugerida a criação do tipo penal específico para crimes ligados ao
terrorismo, com pena de 8 a 15 anos de prisão. A proposta prevê ainda
revogação da Lei de Segurança Nacional, de 1983, usada atualmente para
enquadrar práticas terroristas. A conduta não será considerada crime se tiver
sido cometida por movimentos sociais e reivindicatórios.
10. Bebida a menores
De
acordo com a nova proposta, passaria a ser considerado crime vender ou
simplesmente oferecer bebidas alcoólicas a menores, ressalvadas as situações
em que a pessoa seja do convívio dele.
11. Anistia a índios
Teriam
redução de pena ou simplesmente seriam anistiados os índios que praticarem
crimes de acordo com suas crenças, costumes e tradições. A previsão só valerá
para situações em que haja um reconhecimento de que o ato não viole tratados
reconhecidos internacionalmente pelo País e ficará a critério da decisão do
juiz. O oferecimento de bebida a índios dentro das tribos passaria a ser
crime, com pena de até 4 anos de prisão.
12. Organização criminosa
Cria o
tipo penal, com penas de até 10 anos de prisão. Hoje, por inexistência de
previsão legal, a conduta é enquadrada em formação de quadrilha, com pena
máxima de 3 anos.
13. Máquina eleitoral
Poderá
ser punido com pena de até 5 anos de prisão o candidato que tenha se
beneficiado pelo uso da máquina pública durante o período eleitoral. Hoje, a
pena é de 6 meses. O colegiado enxugou de 85 para apenas 14 os tipos de
crimes existentes no Código Eleitoral. Entre as sugestões, estão o aumento de
pena para crimes eleitorais graves, como a compra de votos e a coação de
eleitores, e a descriminalização de algumas condutas, como a boca de urna.
14. Empresas criminosas
Uma
empresa pode ser até fechada, caso tenha cometido um crime. Ela responderá a
processo se tiver cometido crimes contra a economia popular, contra a ordem
econômica e contra a administração pública, que é o caso de corrupção.
Atualmente, há previsão na Constituição para esse tipo de sanção penal, mas
na prática apenas as que atuam na área ambiental estão sujeitas a
penalização.
15. Informação privilegiada
Cria o
tipo penal para quem se vale de uma informação reservada de uma empresa que
potencialmente pode aumentar as ações dela, tem a obrigação de não a revelar
ao mercado, mas a utiliza para obter privilégios.
16. Cópia de CD
Deixaria
de responder a processo por "violação do direito autoral" quem
fizer uma cópia integral de uma obra para uso pessoal, desde que não tenha
objetivo de lucro. Ou seja, copiar um CD de música ou um livro didático para
uso próprio deixaria de ser crime. Atualmente, a pena para os condenados pela
conduta pode chegar a até 4 anos.
17. Meio ambiente
Seria
aumentada de 1 ano para 3 anos a pena máxima para quem tenha sido condenado
por realizar obra ou serviço potencialmente poluidor sem licença ou
autorização dos órgãos ambientais competentes.
18. Abuso de animais
Passaria
a ser crime abandonar animais, com pena de até 4 anos de prisão e multa. Foi
aumentada a pena para quem tenha cometido abuso ou maus tratos a animais
domésticos, domesticados ou silvestres, nativos ou exóticos. A pena subiria
de 3 meses a 1 ano de prisão para 1 ano a 4 anos.
19. Discriminação
Aumentariam
as situações em que uma pessoa pode responder na Justiça por discriminar
outra. Pelo texto, poderá ser processado quem praticar discriminação ou
preconceito por motivo de gênero, identidade ou orientação sexual e em razão
da procedência regional. Pela legislação atual, só podem responder a processo
judicial quem discrimina o outro por causa da raça, da cor, da etnia, da
religião ou da procedência nacional. Os crimes continuariam sendo
imprescritíveis, inafiançáveis e não sujeitos a perdão judicial ou indulto. A
pena seria a mesma de atualmente, de até 5 anos de prisão.
20. Embriaguez ao volante
Foi
retirado qualquer obstáculo legal para comprovar que um motorista está
dirigindo embriagado. Passaria a ser crime dirigir sob efeito de álcool,
bastando como prova o testemunho de terceiros, filmagens, fotografias ou
exame clínico.
21. Drogas sem crime
Pela
proposta, deixaria de ser crime portar drogas para consumo próprio. Não
haveria crime se um cidadão for flagrado pela polícia consumindo
entorpecentes. Atualmente, a conduta é considerada crime, mas sujeita apenas
à aplicação de penas alternativas. Mas há uma ressalva para a inovação:
consumir drogas em locais onde haja a presença de crianças e adolescentes
continua sendo crime. A venda - de qualquer quantidade que seja - é crime. O
plantio - se for para consumo próprio - não seria mais considerado crime.
22. Delação premiada
O
delator poderia ter redução de pena e até ficar livre da prisão caso colabore
com a Justiça.
23. Crimes cibernéticos
Cria o
tipo penal para tipificar crimes contra a inviolabilidade do sistema
informático, ou seja, aqueles cometidos mediante uso de computadores ou redes
de internet, deixando de serem considerados crimes comuns. Passaria a ser
crime o mero acesso não autorizado a um sistema informatizado.
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