MERVAL PEREIRA


Houve uma evidente mudança de clima no julgamento do mensalão a partir da decisão do ministro Teori Zavascki de rever sua disposição de seguir as decisões tomadas anteriormente à sua chegada ao Supremo Tribunal Federal. Os esforços que estão sendo feitos para encontrar erros na definição das penas passam sempre pelo caso do ex-ministro José Dirceu que, sem ser às vezes nem citado, está no centro da discussão.
Já foi assim quando se tentou reduzir a pena por corrupção ativa e passiva, e agora com a definição de quadrilha, que é o que restou para ele ter a pena reduzida e fugir da prisão fechada, nesta fase ou, eventualmente, na de embargos infringentes.
O ministro Ricardo Lewandowski exibiu um gráfico para mostrar o que considera uma exacerbação das penas aplicadas aos réus condenados por formação de quadrilha. "A evidência matemática é claríssima", alegou Lewandowski, como se a questão fosse apenas numérica.
Ele chegou a acusar o STF de ter aumentado as penas de quadrilha para evitar que o crime prescrevesse, e disse que Dirceu, por exemplo, teve acrescidos 65% da pena na condenação por crime de quadrilha. Na proposta de revisão de penas, derrotada em boa hora, os réus condenados por quadrilha acabariam premiados pela prescrição do crime.
 
Ora, foi exatamente a possibilidade de alguns crimes ligados ao processo do mensalão prescreverem que fez com que o Supremo agilizasse seus trabalhos para colocá-lo em pauta no ano passado. Mas o agravamento da pena de quadrilha para todos os condenados, e não apenas Dirceu, tem sua lógica dentro do processo do mensalão, todo ele montado a partir da denúncia de que fora formada uma quadrilha dentro do Palácio do Planalto para desviar dinheiro público e corromper o Poder Legislativo, num claro ataque ao sistema democrático.
Logo, não é de espantar que as penas para o crime que deu origem aos outros crimes tenham sido aumentadas com rigor. Sobretudo as de Dirceu, identificado pelo Ministério Público como “o chefe da quadrilha”.
Teori Zavascki alega que agiu em decorrência da mudança de entendimento do Tribunal sobre a possibilidade de alteração, em embargos de declaração, das penas fixadas, o que ocorreu no julgamento dos embargos do réu Breno Fichberg. Quem levantou essa possibilidade, para sanar incoerências dentro do processo na chamada “dosimetria das penas” foi outro juiz recentemente nomeado, Luiz Roberto Barroso, que desde o início de sua participação mostrava-se desconfortável com algumas decisões tomadas.
Embora reafirmasse essa posição a cada voto, Barroso manteve a decisão de não interferir, até que sugeriu mudanças pontuais. Zavascki não explicitava sua discordância e, ao contrário, dava sinais de que não via outra possibilidade de mudança das penas a não ser em uma futura revisão criminal, dando a entender que não acataria os embargos infringentes.
No decorrer das discussões de quarta-feira, porém, viu-se autorizado a rever vários votos, até mesmo um do qual não havia participado. A tese do ministro Ricardo Lewandowski, que não desencarnou do papel de revisor, de que as penas em geral foram muito duras tem o apoio explícito do ministro Luiz Roberto Barroso em declarações anteriores, e ontem recebeu o aval de Teori Zavascki, que aproveitou a onda revisionista para acompanhar as propostas de redução das penas de todos os condenados pelo crime de formação de quadrilha.
Os ministros Marco Aurélio Mello e Dias Toffoli votaram com Lewandowski e em um caso, o de Rogério Tolentino, juntou-se ao grupo o ministro Celso de Mello, que viu uma incoerência nas penas, pois o corruptor recebeu condenação mais forte que os corrompidos.
O adiamento para a próxima semana da análise dos embargos infringentes dará mais tempo aos ministros para avaliarem a importância da decisão que tomarão, e ajudou a explicitar o recado de que o Supremo Tribunal Federal não teme pressões. A ideia de que seria melhor decidir logo antes das manifestações programadas para o 7 de setembro deu lugar a uma reflexão mais profunda.
 
A questão agora é saber quantos ministros consideram que foram cometidas injustiças na definição das penas para formação de quadrilha. O ministro Celso de Mello, por exemplo, que no início do julgamento declarara que existiam os embargos infringentes, passou a uma posição “reflexiva” sobre a questão e ontem fez um comentário que pode ter sido uma indicação de posição.
Quando o presidente do STF, Joaquim Barbosa, citou um voto seu contra a aceitação dos embargos infringentes, Celso de Mello interrompeu-o para ressaltar que o caso citado se referia aos tribunais de Justiça e regionais federais. Em ações penais originárias, a aceitação de embargos infringentes pelo STF é “um problema inédito”, segundo o ministro Celso de Melo.

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